quinta-feira, outubro 07, 2004

Revoltosos negam ter sido golpe de estado

Origem do documento: www.noticiaslusofonas.com, 07 Out 2004

Os militares revoltosos da Guiné- Bissau afirmaram hoje que a sua acção não constitui um golpe de Estado, retomando de seguida as negociações com o governo e representantes do Estado-Maior das Forças Armadas guineenses, entretanto suspensas.

Segundo o comunicado dos militares revoltosos, assinado pelo major Baule Ianta Nmone, a acção militar, desencadeada quarta-feira, visa exigir o pagamento de salários em atraso e denunciar as "condições desumanas" nas casernas, a fome "generalizada" em todos os aquartelamentos militares no país, "o elevado grau de corrupção" no seio das chefias militares e o "clientelismo nas promoções".

Os militares não fazem, contudo, nenhuma referência à morte do Chefe de Estado-Maior General das Forças Armadas guineenses, o general Veríssimo Correia Seabra, e do porta-voz do Exército e chefe do Departamento de Recursos Humanos do Estado-Maior das Forças Armadas, o coronel Domingos Barros.

Apesar das autoridades guineenses não terem ainda divulgado qualquer informação oficial sobre a morte de Veríssimo Correia Seabra e Domingos Barroso, os jornalistas em Bissau puderam já ver os corpos dos dois homens.

Os corpos encontram-se na morgue do hospital Simão Mendes, em Bissau, onde foram realizadas as autópsias.

Mesmo assim, as autoridades guineenses mantêm o silêncio que dominou todo o dia de quarta-feira, garantindo apenas que o executivo se mantém em funções.

Ao princípio da tarde, fonte do governo disse à Agência Lusa que tinha sido criada uma "Célula de Crise" para negociar uma "solução pacífica e sem derramamento de sangue" para a crise.

Segundo a mesma fonte, a comissão será liderada pelo próprio primeiro-ministro guineense, Carlos Gomes Júnior, e integra sete ministros e dois conselheiros do chefe do executivo.

O anúncio da criação desta "Célula de Crise" foi feito pouco tempo depois das conversações terem sido interrompidas pela delegação governamental, para se reunir com Carlos Gomes Júnior.

Em Bissau, a situação é aparentemente calma, estão poucos militares nas ruas da cidade, o comércio está aberto e a população saiu à rua como em qualquer dia normal.

Paralelamente, o governo português, a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), e a Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO) desenvolvem esforços para ultrapassar a situação, que afecta o período de transição na Guiné-Bissau, cujo fim está previsto para Abril ou Maio de 2005, com a realização de eleições presidenciais.

O secretário-executivo da CPLP, Luís Fonseca, chega ainda hoje a Bissau, acompanhado do ministro dos Negócios Estrangeiros de Cabo Verde, Vítor Borges.

Sábado espera-se a chegada da missão da CPLP, que será chefiada pelos chefes da diplomacia de Timor-Leste, José Ramos Horta, e de São Tomé e Príncipe, Ovídeo Pequeno.

Para Ramos Horta, "o que se verifica em Bissau é preocupante, mas trata-se de algo que de algum modo era previsível".

"Já desde as minhas anteriores duas estadas na Guiné-Bissau notei que se desenhava uma situação de insatisfação e ressentimento no interior das forças armadas relativamente às suas condições de vida", destacou o chefe da diplomacia timorense.

Também hoje deve chegar a Bissau, uma delegação da CEDEAO chefiada pelos ministros dos Negócios Estrangeiros da Nigéria e Senegal.

Além da morte de Veríssimo Seabra e do Chefe de Informações das Forças Armadas guineenses, general Domingos Barros, estão dados como desaparecidos os chefe dos três ramos das Forças Armadas, o comodoro Quirino Spencer (Marinha), o major-general Melcíades Gomes Fernandes ("Manuel Mina" - Força Aérea) e o general Watna Na Lai (Exército).

De acordo com informação não confirmadas oficialmente, nos diferentes tiroteios registados quarta-feira morreram quatro pessoas e ficaram feridas mais de uma dezena, quase todos militares.

Os militares revoltosos pertencem ao contingente guineense que participou desde o início de Setembro de 2003, na missão de paz da Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental (CEDEAO) na Libéria.

Estes militares, descontentes com a liderança de Veríssimo Seabra e que poderiam levantar objecções à concretização do golpe de Estado liderado por este general a 14 Setembro de 2003 contra Kumba Ialá, foram estrategicamente enviados em missão de paz para a Libéria.



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