domingo, outubro 03, 2004

"Azolla" como biofertilizante

Origem do documento: Esporo - Informação para o Desenvolvimento Agrícola dos Países ACP, nº 45, Outubro de 2001 (CTA - Centre Techniquede Coopération Agricole et Rurale ACP-UE)

Azolla como biofertilizante — um desafio a aceitar

A Natureza deslumbra-nos a cada passo com os recursos que oferece. A Azolla como biofertilizante é mais um exemplo. E a questão é sempre a mesma. Que fazer para agarrar esta potencialidade e colocá-la ao serviço do agricultor de forma utilizável, isto é, ao serviço dos seus objectivos e compatível com os meios de que dispõe. É um desafio às estruturas de investigação agrária e de extensão rural dos PALOP.

A informação básica sobre a matéria aqui exposta provém de um artigo publicado por Carrapiço et al. (2000) onde em paralelo com uma revisão da sistemática do pteridófito do género Azolla, se apresentam os resultados de um projecto de utilização desta planta aquática como biofertilizante, que teve lugar na Guiné-Bissau de 1989 a 1995.

A Azolla é um pequeno feto flutuante, que abriga, na cavidade do lobo dorsal das suas folhas, uma comunidade simbiótica composta por cianobactérias filamentosas da espécie Anabaena azollae e bactérias nomeadamente do género Arthrobacter, que com a planta hospedeira procedem a uma troca de metabolitos, designadamente compostos de azoto fixado pela acção das cianobactérias.

A utilização de Azolla como fonte de azoto na cultura do arroz é praticada desde há séculos na China e no Vietname.

Em África, o incremento do uso deste biofertilizante, foi objecto de um projecto conjunto da ADRAO (Association pour le Développement de la Riziculture en Afrique de l’Ouest) e da FAO, sediado em St. Louis (Senegal), iniciado nos finais da década de 80, com a coordenação da Universidade Católica de Lovaina.

O objectivo foi estudar o uso da Azolla como biofertilizante na cultura do arroz, com desenvolvimento de tecnologias e escolha de estirpes adequadas. Apesar das habituais dificuldades, o projecto registou resultados não apenas quanto ao seu uso como biofertilizante, mas também como alimento para diversas espécies, designadamente suinos, patos e peixes.

O interesse da exploração das potencialidades da Azolla, liga-se mais uma vez aos problemas que afectam as comunidades camponesas que dispõem de limitados recursos financeiros para a adopção de técnicas de fertilização azotada dependentes da aquisição de fertilizantes químicos e que se encontram assim, na prática, impedidas de alcançar os acréscimos de produção de que carecem. Por outro lado, todos os países em vias de desenvolvimento terão à partida evidentes vantagens em que sejam utilizados recursos endógenos no incremento da produção.

No caso vertente, a Azolla pinnata subsp. africana, desenvolve-se naturalmente na Guiné-Bissau, onde, na região em que se situa a estação do INPA de Contubel (Bafatá), onde o projecto foi desenvolvido, forma no rio Geba, durante a época seca, extensos tapetes de cor vermelha escura, cobrindo a superfície da água.

A Azolla foi colhida no rio e objecto de preparação sob a forma de composto para a fertilização dos campos experimentais de arroz. Os ensaios confrontaram diversos níveis de fertilização azotada, quer utilizando apenas ureia (87kg N/ /ha), quer apenas composto de Azolla (7 e 14 ton/ha), quer estas quantidades de composto e um suplemento de ureia (43,5 kg N/ha), tomando como referênciaa uma parcela não fertilizada. O gráfico regista as médias das produções obtidas nos ensaios, mostrando assim, nas condições locais, a contribuição de Azolla para os acréscimos de produção verificados.

O passo seguinte consiste em estudar em detalhe os contornos do processo e a forma de os resultados poderem ser objecto de utilização generalizada pelos camponeses. No artigo sob referência é indicado que "O uso da Azolla na forma de composto foi uma opção para impedir os problemas associados ao descontrolado crescimento deste feto e também escolhido pela fácil forma de ser utilizada pelos camponeses". Não cabe aqui a discussão deste caso concreto, mas apenas tomá-lo como ponto de partida para a consideração do interesse deste tema para a generalidade dos países a que nos dirigimos.

Azolla existe não só na Giné-Bissau, mas ainda em Angola e Moçambique, onde embora em alguns locais não forme tapetes espessos à superfície das águas que permitam a sua utilização directa, não deixa por isso de constituir localmente um enorme potencial de utilização como fonte de azoto para a agricultura.

O artigo sob análise faz referência a alternativas, quer as que se designam de azolacultura, tais como no Egipto, onde a Azolla é cultivada nos campos de arroz no período que antecede a cultura, quer para além da Azolla, na Índia, onde se pratica a exploração directa da actividade das próprias cianobactérias, que são inoculadas nos campos de cultura, por vezes mediante a utilização de substractos para a sua fixação (espumas de poliuretano/polivenilo).

Trata-se de um campo em aberto, com largos horizontes, onde há activa investigação em curso em diversos países. Importa pois estudar, perante os condicionalismos locais, as possíveis formas de utilização, prefigurando os benefícios expectáveis e eventuais riscos, com o objectivo de colocar de uma forma útil e segura, este potencial ao serviço das comunidades camponesas. É um trabalho que tem de ser desenvolvido in situ, com a colaboração activa dos próprios agricultores, para que desde o início sejam apenas desenvolvidas vias que se revelem à partida aderentes às condições locais de produção.

Que fascinante programa para os serviços de Investigação & Desenvolvimento dos países a que nos dirigimos, com objectivos que podem inclusivamente ultrapassar a problemática da fertilização azotada e incluir temas como a alimentação animal e a degradação terciária de efluentes domésticos e industriais!

Que oportunidade para a captação de recursos financeiros junto dos parceiros de desenvolvimento em cada país!

Carrapiço, F., Teixeira, G. & Diniz, M. A., 2000 — "Azolla as biofertilizer in Africa. Challenge for the future". Revista de Ciências Agrárias,
vol. 23 (3-4): 128-138.
Sociedade de Ciências Agrárias de Portugal, Rua da Junqueira, 299
CP 1300-338, Lisboa, Portugal



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