terça-feira, março 22, 2005

Guinéus (13/16)

MÚSICOS MANDINGAS E FULAS



A sensibilidade do mandinga e do fula não é estranha ao que há de enlevante na arte dos sons. Embora a uma distância recuadíssima do desenvolvimento sensitivo e estrutura técnico-musical dos povos que atingiram um requintado nível artístico, é-lhes própria, todavia, uma intuição e poder interpretativo musicais que assinalam princípios e segura evolução.
O estilo, a cadência e os curiosos entrechos descritivos das suas composições acusam reminiscências, senão influência dominante da música, cultura e religiosidade árabes.
Alguns dos seus instrumentos típicos, de cordas, de que são os próprios construtores, são uma imitação ou derivantes do instrumental levantino e norte-africano.

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Não tarda o pôr do Sol mas ainda há luz e o ambiente entra a refrescar. Na aldeia mandinga o tocador de korá rodeia-se dos apreciadores de música. Caixa de ressonância chegada ao ventre, braço das cordas atirado para diante, o músico dedilha com ambas as mãos a executar uma canção, uma sonata e hinos guerreiros ou religiosos. A sequência de sons em melodia são o fundo de cantos de entrechos poéticos de elegia a Alá ou ao famoso guerreiro dos tempos bélicos quando não seja, mais vulgarmente, um relato cantado dos procedimentos humanos filtrados por um fino senso crítico.
Na povoação fula os tocadores de viola e nhanhéru (violino) ficam-se horas a fio, firmes, expressões austeras. E as cordas gemem, em surdina, entoações dolorosas de melopeia, numa repetição constante, terrivelmente monótona. Aparecesse ali um Rubinstein, esse mago de execuções vigorosas... Desesperava! Mas o que importa é fazer a arte no estilo próprio, satisfazendo um auditório que a vive, olhares fixos, em êxtase, parecendo ver algo lá no céu... O baque soturno do dondom (pequeno tambor) não perturba o recolhimento artístico. Este só cede perante as exteriorizações alegres da juventude feminina que foi ao toucador, veste-se de roupas coloridas, enfeita-se de pulseiras, colares e medalhinhas em profusão e que, roda feita, bate palmas cadenciadoras e repete as expressões do matxubé bailador a dançar e cantar no meio do círculo, pandeireta a tremular compassos de vertigem.
Com a proximidade da noite termina a matinée artística do mandinga ou do fula. Mais logo, quando dominar a escuridão, há-de ouvir-se o rufar nervoso das baquetas e das mãos nas peles retesas dos tambores. Será a abertura do concerto característico, verdadeira sinfonia fantástica, de sons fortes, que esmagam tirânicamente o enigmático silêncio das noites africanas.


No dia de encerramento das festas do fanado (circuncisão) estas jovens biafadas entram na aldeia onde têm recepção festiva.

A dança ritmada pelo tambor e pelo bater das palmas é lenitivo para esquecerem o martírio a que foram sujeitas durante a estada no mato, onde aprenderam a ser mulheres, e humildes...

À esquerda: uma rapariga biafada entrega-se aos cuidados da cabeleireira nativa para realçar, ainda mais, a sua beleza
À direita: já com o cabelo entretecido em artísticas fieiras, nas quais foram dependurados búzios, medalhas, contas e amuletos, estes como defesa para os maus olhados...



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